21/03/2024

O direito da testemunha de jeová em realizar cirurgia sem transfusão de sangue e o respeito aos seus princípios religiosos.

A religião Testemunhas de Jeová é um culto originário do Cristianismo, e devido à sua interpretação da Bíblia, presente no Novo Testamento, mais precisamente nas passagens de “Gênesis 9:4; levítico 17:10. Deuteronômio 12:23. Atos 15:28, 29”, ordena-se que se abstenham de sangue. Devido a isso, pacientes que são adeptos dessa religião recusam a transfusão de sangue, em procedimentos médicos.

Já os médicos, em sua maioria, entende pela importância de fazer uso em um procedimento cirurgico da bolsa de sangue, mesmo que seja de baixo risco para a vida do paciente, para , em sendo necessário, possam realizar a transfusão de sangue e assegurar a vida do paciente. No entanto, os pacientes que fazem parte da religião das Testemunhas de Jeová, não permitem a transfusão ou doação de sangue.

Essa discordância entre médicos e pacientes que são Testemunhas de Jeová vem sendo discutida por diversas áreas. Assim, o Supremo Tribunal Federal (STF) vai decidir esse ano ainda, se, em razão de sua consciência religiosa, as Testemunhas de Jeová têm o direito de se submeterem a tratamento médico, inclusive cirurgias, sem transfusão de sangue.

Observa-se que há diversas decisões a favor dos pacientes, pois existem opções que não utilizam a transfusão sanguínea. Uma das opções seria administrar eritropoietina ao paciente. Esta substância estimula o aumento dos valores de hemoglobina no sangue e deve ser usada no período pré-operatório, de preferência três semanas antes da data prevista para a cirurgia. Outra opção é utilizar uma máquina que recupera o sangue que seria perdido no período intraoperatório. O aparelho aspira o sangue do campo operatório e consegue processá-lo para posterior reinfusão no paciente. No entanto, a máquina recupera apenas metade do sangue perdido, e seu uso não é recomendado em cirurgias oncológicas, devido ao risco de recontaminação, por exemplo.

Mesmo com diversos tratamentos avançados, o entendimento não se encontra pacificado pelo STF o direito de submeter-se a tratamentos médicos e cirurgias sem transfusão de sangue. Todavia, há diversos julgados que estão determinando e obrigando os hospitais a realizarem as cirurgias sem que o paciente, Testemunha de Jeová, precise assinar o termo para eventual transfusão de sangue.

Podemos ver decisões favoráveis na 6º Turma Civil do TJ/DF, processo n.º 0712619- 82.2019.8.07.0001, como também na Vara da Fazenda Pública, Acidentes do Trabalho e Registros Públicos de Lages (SC), processo n.º 5001676-92.2024.8.24.0039, e em diversos outros estados, que determinaram que os hospitais devam disponibilizar uma máquina que substitui a transfusão de sangue em uma cirurgia de um paciente que é Testemunha de Jeová.

Entendemos assim que é de suma importância respeitar as crenças religiosas e o direito dos pacientes Testemunhas de Jeová para a realização de procedimentos e cirurgias sem a transfusão de sangue. Entramos, sim, em uma seara complexa que envolve ética e crença religiosa. Devido aos diversos avanços na tecnologia médico hospitalar, não haveria mais necessidade desse embate, pois a vida seria assegurada sem a obrigatoriedade da transfusão sanguínea, como demonstramos acima com novas técnicas e tratamentos, sem a necessária obrigatoriedade de violar preceitos religiosos.

Entretanto, é necessário trazer o entendimento do Conselho Federal de Medicina, que editou a Resolução CFM 1.021/80, a qual orienta os médicos sobre como proceder no caso de pacientes que, por motivos diversos, inclusive de ordem religiosa, recusam a transfusão de sangue.

A resolução CFM 1.021/80 traz em suas diretrizes que, em caso de ocorrer a recusa em permitir a transfusão de sangue, o médico, obedecendo ao seu Código de Ética Médica, deverá observar a seguinte conduta:

1º – Se não houver iminente perigo de vida, o médico respeitará a vontade do paciente ou de seus responsáveis.

2º- Se houver iminente perigo de vida, o médico praticará a transfusão de sangue, independentemente de consentimento do paciente ou de seus responsáveis

Em nome do respeito ao direito de crença, se houver tempo hábil, o primeiro caminho a ser adotado pelo profissional será encontrar tratamento substitutivo ou alternativo. Essa atitude é a que mais se compatibiliza com as regras deontológicas do exercício da Medicina e com os direitos do paciente, assegurados pela ordem constitucional. Em não havendo alternativa, caberá ao medico avaliar o caso concreto, utilizando de todos os recursos para salvar a vida do paciente ou se, apesar dos riscos, respeitando a sua crenca religiosa.


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